22.2.11

Imitação de Caeiro

Passa uma águia diante de mim
e pela primeira vez no universo eu reparo
(sem nem andar por verso algum)
que o que pensava que era o que é
não é nada, nem nunca nada será.

Nas garras da águia a águia agarra
pressionada sua presa e às pressas passa
manchada da cor que lhe tinge as penas.
E a cor que corre colada à sua imagem
não é de fato sua cor que debaixo está.
A cor não tem cor em cima da cor da asa da águia
e seu movimento não se move nunca a não ser na parada
em que o mundo move o movimento em volta de nada.

A águia não é apenas a águia,
é tudo e nada.
É debaixo das tintas outra cor pálida.
E se numa tela eu retrato o seu voar,
bem lá ela estará.
Mas na tela ela é outra, ainda que múltipla;
na tela há um outro céu
e uma outra presa que caçar,
mas lá atrelada à tela a mesma águia que vi voar
sempre voará.

Há uma águia em cada olhar meu pelo mundo afora…

Um comentário:

  1. "Há uma águia em cada olhar meu pelo mundo afora"...

    desejo cativo

    MUITO BOM!

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