kate mccgwire |
Se o poema
mudou
É porque eu
mesmo mudei
É porque
todos nós mudamos
É porque o
universo mudou
Homens são menos e menos determinados por suas nações, suas classes,
suas línguas-mães, e mais e mais pela função que executam na sociedade e no
universo, por presenças, texturas, fatos, informação, impulsos, energias. Eles
têm penetrado o espaço e já têm adaptado seus movimentos, logo suas idéias, seus
nós-i[1]
de vida para essa nova liberdade. Poesia transmuta-se de arte a ação, de
recitação a constelação, de frase a estrutura, de música ao centro de energia. Por
anos, grupos ou autores isolados, que na maior parte do tempo ignoraram-se uns
aos outros e ainda tiveram consciência da humanidade que chama à vida cósmica e
funcional, isto é, à metamorfose que nos conduz além do medo existencial, têm
feito pesquisas em direção à poesia a qual pode ser dado o nome genérico de
Espacial (que inclui conceitos de tempo, estrutura, energia):
poesia concreta: trabalhando com linguagem material criando estruturas
com ela, transmitindo primariamente informação estética;
poesia fonética: baseada em fonemas, corpos sonoros de linguagem, e
geralmente falados sobre todos os sons emitidos pelos órgãos vocais humanos,
trabalhados em gravações e tendendo à criação de som espacial;
poesia objetiva: arranjo pictórico, gráfico, escultural e musical
devido à colaboração de pintores, escultores, músicos e tipógrafos;
poesia visual: a palavra ou seus elementos tomados como objetos e
centros de energia visual;
poesia fônica: o poema composto diretamente em gravação, palavras e
sentenças sendo tomadas como objetos e centros de energia auditiva;
cibernética, serial, permutacional, verbofônica, poesia
Porque eles têm perseguido pontos em comum, essas diversas tendências
(que por sinal muitas vezes se parecem) podem ser agrupadas em um só movimento
(que deixa cada um de seus promotores livres):
Estes tipos de poesia tendem a tornarem-se objetivos, isto é, a serem
não mais ambos os veículos de conteúdo moral ou filosófico ou a expressão de um
ego social que se pergunta em vão “Quem sou eu?”, mas a liberação de uma
energia, o compartilhamento de informação estética, a objetivação da linguagem,
o último ser concebido como um universo autônomo (contendo outros universos
como ele está contido neles, de onde sua autenticidade). Todos esses poetas
estão se dirigindo a este ponto ideal onde a palavra se cria a si mesma,
liberando, assim, uma realidade universal.
Essas tentativas complementam-se: as línguas nacionais estão
tornando-se mais e mais burocráticas, tendo muitas vezes perdido seus poderes
de encantação; os elementos viventes restantes das línguas devem ser libertados
(concreta, objetiva, visual: poesia) e estruturados pela renovação e
possivelmente mudando os valores sintáticos e semânticos. É uma questão de
abandonar a linguagem robótica de existência dormente e encontrar os
signos-relâmpagos, o clamor do sol, a enorme riqueza que existe nos órgãos
vocais do homem que o uso comum tem eliminado durante o curso dos séculos
(poesia fonética).
Paralelamente criamos uma poesia francamente espacial de estruturas,
de montagens, de energias. O projetado maior que a projeção, destinado a
“explorar” o espaço.
Esses tipos de poesia escapam da velha ordem social e dos depósitos de
idéias disponíveis que permaneceram imutáveis por centenas de anos, nas quais
todas as revoluções são engolfadas e perdidas. Por exemplo: as línguas
indo-européias que são baseadas na mesma estrutura sujeito-verbo-objeto, nas
quais os nossos dias e modo de vida tem sido detidos.
Esses tipos de poesia não estão contentes em explorar, como fez o
surrealismo, com a ajuda dos postulados lingüísticos fixados, impostos e
conseqüentemente aprisionados: isolam a linguagem, modificam-na, perturbam-na,
liberando assim sua vitalidade profunda, eles criam novas estruturas (acústica
bem como visual, sintática bem como semântica) provocando o aparecimento das situações
até aqui desconhecidas e pondo o homem num permanente ambiente de criação e
liberdade.
Sendo assim, esses tipos de poesia tendem mais e mais à destruição da
própria idéia de trabalho de arte em favor da idéia de energia transmitida. Por
exemplo: um ramo da poesia concreta produz estruturas, informação estética,
esquemas criados pela consciência, experiências metódicas, racionais, a
“montagem” implica a tudo bem como a participação pura do emissor e do
receptor.
Outro exemplo: sonie é um
exemplo de sons trabalhados sem gravação, transformados, purificados,
construídos, comunicando finalmente ao auditório somente a estrutura.
Esses tipos de poesia em sua diversidade bem como em suas tendências
compartilhadas estão impulsionando forças, são o retorno do homem, liberado da
linguagem pré-estabelecida imposta desde a infância, com seu peso de idéias e
moralidades, pela raiz das forças e lá trabalhando amparadas pelas mais
modernas técnicas e consciências, como o cosmonauta no espaço — a ética
residindo na audácia da mudança. Alegria na ausência de certezas estreitas,
alegria no mundo aberto como ele é, alegria de criação em criação infinitamente
espaçada, esses tipos de poesia não são “fixos”, são constante devir. É neste
sentido que se deve entender esta posição do texto: chegamos neste ponto em 10
de outubro de 1963.
- A linguagem deve ser entendida como a totalidade de funções, relações, radiações, concreções linguísticas, mas também como barulhos, gestos, silêncios pelos quais a linguagem transplanta-se diretamente sobre o universo no qual vivemos.
Tr. Irène Montjoye Sinor,
M.E.S.
1963
(De Les Lettres, nº 32)
Position I du Movement
International foi esboçado por Pierre Garnier da França e assinado pelos
seguintes: Mario Chamie, Carl-Friedrich Claus, Ian Harnilton Finlay, Fugimoto
Yasuo, John Furnival, Ilse Garnier, Pierre Garnier, Eugen Gomringer, Boliumila
Grögerová, Josef Hirsal, Anselm Hollo, Sylvester Houédard, Ernst Jandl,
Kitasono Katsué, Frans van der Linde, E. M. de Melo e Castro, Franz Mon, Edwin
Morgan, Ladislav Novák, Herbert Read, Toshinko Shimizu, L. C. Vinholes, Paul de
Vree, Emmett Williams, dos seguintes países: Alemanha, Áustria, Inglaterra,
Bélgica, Brasil, Escócia, Finlândia, França, Holanda, Japão, Portugal, Suíça,
Tchecoslováquia, Estados Unidos da América.
Ferdinand Kriwet concordou com o Position
I onde poesia “objetiva”, “fonética”, e “visual” estão relacionadas. As
razões de Henri Chopin para estar impossibilitado de assinar o documento são
discutidas em sua poesia.
Tradução do
inglês a partir da versão do UbuWeb, in: http://www.ubu.com/papers/garnier01.html
[1] Inode, no original. Na teoria de sistemas operacionais, um nó-i (inode, ou index node) é uma estrutura de
dados constituinte de um sistema de arquivos que segue a semântica Unix. O nó-i
armazena informações sobre um arquivo, tais como o dono, permissões e sua
localização. (N.T)
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Pierre Garnier (poeta francês) foi fundador do "Spatialisme" ("Espacialismo").
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